Conseqüências e características das cidades
Ângelo Tiago de Miranda*
Somente na segunda metade do século 20, o Brasil tornou-se um país urbano, ou seja, mais de 50% de sua população passou a residir nas cidades. A partir da década de 1950, o processo de urbanização no Brasil tornou-se cada vez mais acelerado. Isso se deve, sobretudo, a intensificação do processo de industrialização brasileiro ocorrido a partir de 1956, sendo esta a principal conseqüência entre uma série de outras, da "política desenvolvimentista" do governo Juscelino Kubitschek.
É importante salientar que os processos de industrialização e de urbanização brasileiros estão intimamente ligados, pois as unidades fabris eram instaladas em locais onde houvesse infra-estrutura, oferta de mão-de-obra e mercado consumidor. No momento que os investimentos no setor agrícola, especialmente no setor cafeeiro, deixavam de ser rentáveis, além das dificuldades de importação ocasionadas pela Primeira Guerra Mundial e pela Segunda, passou-se a empregar mais investimentos no setor industrial. Êxodo rural
As indústrias, sobretudo a têxtil e a alimentícia, difundiam-se, principalmente nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Esse desenvolvimento industrial acelerado necessitava de grande quantidade de mão-de-obra para trabalhar nas unidades fabris, na construção civil, no comércio ou nos serviços, o que atraiu milhares de migrantes do campo para as cidades (êxodo rural). O processo de urbanização brasileiro apoiou-se essencialmente no êxodo rural. A migração rural-urbana tem múltiplas causas, sendo as principais a perda de trabalho no setor agropecuário - em conseqüência da modernização técnica do trabalho rural, com a substituição do homem pela máquina e a estrutura fundiária concentradora, resultando numa carência de terras para a maioria dos trabalhadores rurais.
Assim, destituídos dos meios de sobrevivência na zona rural, os migrantes dirigem-se às cidades em busca de empregos, salários e, acima de tudo, melhores condições de vida.
População urbana
Atualmente, a participação da população urbana no total da população brasileira atinge níveis próximos aos dos países de antiga urbanização da Europa e daAmérica do Norte. Em 1940, os moradores das cidades somavam 12,9 milhões de habitantes, cerca de 30% do total da população do país, esse percentual cresceu aceleradamente: em 1970, mais da metade dos brasileiros já viviam nas cidades (55,9%). De acordo com o Censo de 2000, a população brasileira é agora majoritariamente urbana (81,2%), sendo que de cada dez habitantes do Brasil, oito moram em cidades.
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), no ano de 2005 o Brasil tinha uma taxa de urbanização de 84,2% e, de acordo com algumas projeções, até 2050, a porcentagem da população brasileira que vive em centros urbanos deve pular para 93,6%. Em termos absolutos, serão 237,751 milhões de pessoas morando nas cidades do país na metade deste século. Por outro lado, a população rural terá caído de 29,462 milhões para 16,335 milhões entre 2005 e 2050.
O processo de urbanização no Brasil difere do europeu pela rapidez de seu crescimento. Na Europa esse processo é mais antigo. Com exceção da Inglaterra, único país que se tornou urbanizado na primeira metade do século 19, a maioria dos países europeus se tornou urbanizada entre a segunda metade do século 19 e a primeira metade do século 20. Além disso, nesses países a urbanização foi menos intensa, menos volumosa e acompanhada pela oferta de empregos urbanos, moradias, escolas, saneamento básico, etc.
Em nosso país, 70 anos foram suficientes para alterar os índices de população rural e os de população urbana. Esse tempo é muito curto e um rápido crescimento urbano não ocorre sem o surgimento de graves problemas.
Favelização e outros problemas da urbanização
A urbanização desordenada, que pega os municípios despreparados para atender às necessidades básicas dos migrantes, causa uma série de problemas sociais e ambientais. Dentre eles destacam-se o desemprego, a criminalidade, a favelização e a poluição do ar e da água. Relatório do Programa Habitat, órgão ligado à ONU, revela que 52,3 milhões de brasileiros - cerca de 28% da população - vivem nas 16.433 favelas cadastradas no país, contingente que chegará a 55 milhões de pessoas em 2020.
O Brasil sempre foi uma terra de contrastes e, nesse aspecto, também não ocorrerá uma exceção: a urbanização do país não se distribui igualitariamente por todo o território nacional, conforme podemos observar na tabela abaixo. Muito pelo contrário, ela se concentra na região Sudeste, formada pelos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
· Região Sudeste
Apesar desses quatro Estados ocuparem somente 10% do território brasileiro, a segunda menor em área, neles se encontram mais de 78 milhões de habitantes (IBGE, 2005), 90,5% dos quais vivem em cidades.
É também no Sudeste que se encontram três das cidades brasileiras com mais de 1 milhão de habitantes (São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte), bem como 50% das cidades com população entre 500 mil e 1 milhão de habitantes.
As sucessivas crises econômicas que o país conheceu nas últimas décadas fez seu ritmo de crescimento em geral diminuir e com isso o fluxo migratório para o Sudeste se reduziu e continua em declínio.
· Centro-Oeste e Sul
A segunda região de maior população urbana no país é a Centro-Oeste, onde 86,7% dos habitantes vivem em cidades. A urbanização dessa região é ainda mais recente e foi impulsionada pela fundação de Brasília, em 1960, e pelas rodovias de integração nacional que interligaram a nova capital com o Sudeste, de um lado, e a Amazônia, de outro. Além disso, há o desenvolvimento do setor do agronegócio. A agropecuária impulsionou a urbanização do Centro-Oeste, cujas cidades apresentam atividades econômicas essencialmente de caráter agro-industrial. A região Sul, apesar de contar com o terceiro maior contingente populacional do país - mais de 26 milhões de habitantes, 80,9% vivendo em cidades - e uma economia vigorosa, também baseada na agropecuária apresenta um índice mais baixo de urbanização. Ao contrário da região Centro-Oeste, a região Sul conheceu uma urbanização mais lenta e limitada até o início da década de 1970. A estrutura agrária assentada na pequena propriedade e no trabalho familiar, apoiado no parcelamento da terra nas áreas de planaltos subtropicais, limitava a migração de pessoas do campo para o meio urbano. Depois, a mecanização da agricultura e a concentração fundiária impulsionaram o êxodo rural.
· Norte e Nordeste
O grau de urbanização da região Norte é o mais baixo do país: 69,9% em 2003. No entanto, é a região que mais se urbanizou nos últimos anos. Entre 1991 e 2000, segundo o IBGE, o crescimento urbano foi de 28,54%. Além de ter-se inserido tardiamente na dinâmica econômica nacional, a região tem sua peculiaridade geográfica - a floresta Amazônica - que representa um obstáculo ao êxodo rural. Ainda assim, Manaus (AM) e Belém (PA) são as principais regiões metropolitanas com mais de 1 milhão de habitantes cada. Com mais de 51 milhões de habitantes o Nordeste é a região brasileira com o maior número de municípios (1.793), mas somente 69,1% de sua população é urbana. A estrutura agrária baseada na pequena propriedade familiar, na faixa do Agreste, colaborou para segurar a força de trabalho no campo e controlar o ritmo do êxodo rural. O baixo rendimento e a baixa produtividade do setor agrícola restringiu a repulsão dos habitantes rurais, ao passo que o insuficiente desenvolvimento do mercado regional limitou a atração exercida pelas cidades.